domingo, 16 de março de 2008

Mudança climática: Mentiras verdadeiras

Por Stephen Leahy, da IPS

As incomuns baixas temperaturas de inverno registradas em janeiro nos Estados Unidos parecem ter interrompido a hibernação dos que negam a mudança climática, pois lotaram sites da Internet com mensagens sobre o “grande engano do aquecimento global”. Inclusive organizaram uma conferência para sustentar sua postura, esta semana em Nova York. “O aquecimento do planeta não é uma crise global”, disse o Instituto Heartland, organizador da Conferência Internacional sobre Mudança Climática.

Heartland é conhecido por fazer lobby com seu perfil de direita e aceitar mais de US$ 500 mil do consórcio multinacional de petróleo ExxonMobil entre 1999 e 2005, segundo documentos da própria empresa divulgados pela organização ambientalista Greenpeace, e milhares de dólares mais da indústria do tabaco. Não surpreende terem enviado um comunicado, na terça-feira, no qual insistiam em que todos os esforços “para reduzir as emissões de dióxido de carbono sejam abandonados imediatamente”.

O dióxido de carbono, o metano e o óxido nitroso são alguns dos chamados gases causadores do efeito estufa aos quais a maioria dos cientistas atribui o aquecimento do planeta. “O aquecimento causado pelo homem é um engano total. Não se baseia em fatos”, vociferou Rush Limbaugh, um apresentador de rádio conservador em seu programa do dia 27 de fevereiro, com cerca de 13 milhões de ouvintes. “Frio e neve sem precedentes foram comuns em todo o hemisfério norte neste inverno”, garantiu Limbaguh.

O hemisfério norte é mais do que Estados Unidos e Canadá. Também fez frio na China e no Oriente Médio, mas esteve bastante quente na Grã-Bretanha e na maior parte da Europa. No começo de fevereiro a temperatura esteve temperada em Edimburgo, com média de 14 graus, normal em julho para uma cidade escocesa. A previsão desta semana para Moscou, a capital mais ao norte do mundo, indica chuvas e uma temperatura média de três graus, e não neve e 10 graus abaixo de zero como é habitual. Essas temperaturas não provam nada. É apenas o tempo.

Mas o clima é algo totalmente diferente nas variações diárias de temperatura em qualquer lugar. O clima são as condições atmosféricas em um período limitado e em uma determinada região. Um janeiro frio é apenas o tempo que há nos Estados Unidos, nada mais. Os últimos dados da agência espacial norte-americana (Nasa) mostram que “as temperaturas globais caíram de forma drástica” no ano passado, chegou a dizer Limbaugh quando, de fato, esse organismo informou que em 2007 foi o segundo ano mais quente de que se tem registro. Refutar este fluxo de informação, ao que parece, inesgotável, para não mencionar as mentiras grosseiras, não tem sentido.

A maioria dos cientistas já não perde tempo porque sentem que responder a esses autoproclmados “cépticos da mudança climática” nada mais faz do que dar asas a eles e aos seus patrocinadores, corporações petrolíferas, entre outros. Longe de chamar pelo silêncio quando o mundo luta para compreender a realidade da mudança climática. Os que negam esse fenômeno nos Estados Unidos se mantêm firmes. O jornal The Washington Post informou no mês passado que uma nova organização, apoiada pela indústria do carvão, e seus aliados, lançou uma campanha de US$ 35 milhões para exaltar a oposição contra a legislação contra a mudança climática.

As esmagadoras provas científicas do acelerado aquecimento da Terra não bastam para que inclusive respeitados órgãos de imprensa, como The Wall Street Journal, dos Estados Unidos e National Post, do Canadá, continuem publicando artigos que anunciam uma iminente idade do gelo ou esfriamento global. Não costuma haver fundamentos científicos por trás dessas afirmações, mas os “fatos” frequentemente são distorcidos e os comentários de cientistas deliberadamente deformados, e depois figuram em sites ou blogs durante meses ou até anos.

Os que negam que a atividade humana seja responsável por grande parte da mudança climática continuarão fazendo tudo o que podem para confundir e atrasar a implementação de ações. E podem ser convincentes ao citar reconhecidos especialistas e tergiversar suas opiniões e os resultados de suas pesquisas. A IPS oferece uma série de conselhos de senso comum para verificar esse tipo de informação. Em primeiro lugar, é bastante fácil checar uma afirmação suspeita com o site de busca Google.

O aquecimento do planeta é causado por variações na atividade solar, disse uma pessoa as IPS. Sua prova é um artigo “científico” do jornal Investor’s business que assegurava que essa era a conclusão do Instituto Max Planck de Pesquisas do Sistema Solar, da Alemanha. Uma rápida visita ao site do instituto permite ler suas conclusões em primeira mão. “A atividade solar afeta o clima, mas tem um papel menor no atual aquecimento do planeta”, afirmo o centro de pesquisas.

Em segundo lugar, buscar a fonte de financiamento. Quem se beneficia com a negação da mudança climática? Não é tão difícil saber a resposta. O vice-presidente de Desenvolvimento de Novos Produtos da General Motors Corp., Bob Lutz, disse à imprensa no Texas que a teoria do aquecimento do planeta é “um grande monte de merda”. Antes havia ridicularizado os esforços para obrigar os fabricantes de automóveis a construírem veículos menores e mais eficientes escrevendo em seu blog que “é como tentar enfrentar o problema de obesidade deste país obrigando os fabricantes de roupa vender tamanhos menores e apertados”.

O jornalista Ross Gelbspan seguiu a pista do dinheiro que fluiu da indústria automobilística e petrolifera para várias organizações e institutos de direita e publicou seu resultado em “Teh heat is on” (A calefação está acesa) e “Boiling point” (Ponto de ebulição). Como os cientistas se beneficiam das conclusões de que as atividades humanas aceleram a mudança climática sem se darem conta? Os que negam o fenômeno afirmam que assim recebem financiamento para suas pesquisas a esse respeito. É verdade, mas também receberiam dinheiro se investigassem a contaminação da água ou da camada de ozônio.

A camada de ozônio é a cobertura estratosférica que protege a vida do planeta das radiações solares nocivas. Quando os cientistas realizam pesquisas, apenas tentam responder perguntas que surgiram. Não lhes importa a quais conclusões chegarão. São o que são: os humanos aceleram a mudança climática. Se quiserem dinheiro trabalhariam em Wasl Street, certo?


(Envolverde/IPS)

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